Dapper, Olfert: Nasceu no ano de 1635, em Amsterdã. Em janeiro de 1636, foi batizado numa igreja luterana da mesma cidade. Em 1658, ingressou na Universidade de Utrecht e, dois anos depois, assinava como "doctor medicinæ", embora não haja evidência de que estudava medicina. Em 1663, publicou um livro sobre a história de Amsterdã e, em 1665, uma tradução ao holandês dos trabalhos de Heródoto. Aproveitando a crescente atividade editorial de Amsterdã, com pouco mais de 30 anos, o humanista Dapper embarcou numa exaustiva pesquisa geográfica que iria ocupar o resto da sua vida. O vasto projeto abordou primeiro a África (1668), depois a China (1670), Pérsia e Geórgia (1672), e a Arábia (1680), embora ele nunca viajasse a essas terras. De fato, parece que Dapper nunca saiu da Holanda. A sua obra mais conhecida é a “Descrição da África...” (1668) que, embora deva ser interpretada com cautela, ainda constitui uma referência fundamental para a história da África. Com uma abordagem interdisciplinar, entrelaçando aspectos econômicos, políticos, medicina, vida social e costumes, Dapper produziu uma obra singular que vai além de um simples compêndio de curiosidades exóticas. O livro foi traduzido, com o autor ainda em vida, para o inglês, o francês e o alemão. Dapper faleceu em 29 de dezembro de 1689 em Amsterdã (Musée Dapper, Paris).
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[4] a 303
Região/Localidade: Costa do Ouro
Confiabilidade: Observação ou citação
Texto Original
Tradução
Existe um grande número de Fidalgos, os quais são os nobres do país. Para adquirir este grau de honra, é frequente que eles se arruínem. Veja como alguém se torna nobre; aquele que quiser se fazer reconhecer como nobre, vai requisitar a permissão ao Brasso que é o Capitão[.] Quando a obtém, ele avisa a Nobreza da aldeia, enviando a cada um uma galinha e um pote de vinho de Palma, para os convidar para se encontrarem um tal dia no mercado da localidade. Durante esse tempo, o pretendente faz os preparativos necessários para tratar bem os convidados, que não deixam de vir no dia e lugar combinados, com a melhor equipagem possível. Primeiramente uma vaca é levada para o lugar, em seguida os homens vêm e colocam-na no lugar mais honrado do mercado, o Brasso toma parte seguido de uma trupe de Jovens muito hábeis, armados de escudos e Azagaias. Os instrumentos tocam, o tambor batuca, as trombetas ressonam, dança-se, fazem-se torneios, divertem-se o melhor possível. Um pouco depois, chega o jovem aspirante à Nobre, à custa de quem se faz toda a festa, seguido de um garoto que carrega uma cadeira atrás dele, sobre a qual o aspirante se senta. Todos seus futuros colegas o vêm parabenizar, e apanhando palha de um teto eles a jogam diante dele, a fim de que ele a pise com os pés. As damas que estão na outra extremidade circundam a mulher do pretendente e lhe fazem quase as mesmas honras: elas a penteiam e lhe enfeitam a cabeça com pequenas cruzes e Fetissis de ouro: elas lhe põem um colar de ouro no pescoço, uma cauda de cavalo na mão; e no braço direito uma grande argola de ouro, que tem uma placa de ouro maciço nos dois lados. A vaca é levada, em seguida, ao lugar onde elas estão, fazem-na passar em revista diante da nova Dama e de todas as suas companheiras, e todos os Nobres a seguem dançando e saltando./303/ Concluída esta volta, trazem o animal e o amarram lá onde ele estava. Os Jovens continuam a demonstrar sua alegria, ao som do tambor, com jogos, torneios e corridas, e as mulheres, por sua vez, não demonstram menos alegria, com canções e danças. Algumas vezes eles carregam ora o homem, ora a mulher, sobre uma cadeira, dando a volta à cidade desse modo, e lhes jogando vez ou outra farinha branca no rosto. Quando a noite chega são levados a casa. No dia seguinte, são procurados em casa para a cerimônia e se divertem de maneira semelhante ao dia precedente. No terceiro dia a vaca é sacrificada e depois esquartejada em quatro partes; os convidados comem a carne: mas o novo Nobre e sua esposa não saboreiam dela, na crença de que eles iriam morrer em um ano, caso o fizessem. Durante a celebração da festa, o Aspirante coloca uma bandeira branca sobre o teto da sua casa, como signo de alegria e de candura. Quando a festa finaliza, o corpo de Nobres lhe envia a cabeça da vaca pintada de diversas cores e envolta em diversos panos velhos que são os Fetisis, a marca e os títulos de sua Nobreza. Os privilégios que ele adquire em virtude dessa qualidade são o direito de ter escravos, de vendê-los e trocá-los. Como a solenidade dessa festa custa geralmente quatrocentos ou quinhentos francos, se o aspirante não tiver amigos que o presenteiem nessa ocasião, ele se encontrará, frequentemente, depois da cerimônia, reduzido a uma extrema pobreza e obrigado a ganhar a vida pelo trabalho de suas mãos. Porém, eles não deixam de estar extremamente orgulhosos de sua Nobreza, e eles têm razão; pois é tudo que lhes resta: tão logo eles juntam alguma riqueza, a investem em escravos, crendo se enriquecer deste negócio.
Palavras-chaves
Cultura material / Panos
Cultura material / Bebidas alcoólicas / Vinho de Palma
Práticas rituais / Cerimônias/festas públicas / Enobrecimento
Encontros religiosos / Escravidão e religião
Práticas rituais / Sacrifícios / Animais
Práticas rituais / Tabus
Práticas rituais / Cerimônias/festas públicas
Práticas rituais / Cantos/cantigas
Cultura material / Trono/cadeira...
Cultura material / Bandeira/estandarte
Cultura material / Instrumentos musicais / Trompete/flauta...
Cultura material / Cauda de cavalo
Fetiche / Estético
Cultura material / Ouro
Práticas rituais / Dança
Cultura material / Instrumentos musicais / Tambor